Muitos servidores públicos municipais que se aposentaram pela Previdência Social – INSS, ou estão sendo intimados para pedirem suas exonerações de forma amigável ou, estão sendo exonerados pelos Senhores Prefeitos Municipais.
A nosso sentir, quando o pedido de exoneração nesse sentido é de iniciativa do próprio servidor, de maneira espontânea, porque este não quer mais permanecer trabalhando no serviço público, nada há de irregular. Todavia, quando o servidor é praticamente forçado a pedir sua exoneração porque se aposentou pelo INSS, sob pena da iniciativa partir do ente municipal, entendemos que tanto numa situação como na outra, as exonerações são ilegais e arbitrárias.
Explica-se: duas são as razões!
- Inexistência de Processo Administrativo prévio.
A primeira delas é por infringência ao regramento previsto art. 5º, LV da Lei Fundamental Brasileira, que assim estabelece: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Não pode o servidor público efetivo (= estável) ser destituído do seu cargo sem a observância do devido processo legal, sob pena de cerceamento do seu sagrado direito de defesa. Há, portanto, necessidade de se instaurar um processo administrativo antes de se falar em exoneração, dando ao servidor o direito de se defender, de forma ampla, com o exercício do contraditório.
Em havendo exoneração do servidor sem a observância desses requisitos legais, o ato é nulo de pleno de direito, devendo o servidor ser reintegrado em seu cargo imediatamente. E mais: com direito ao recebimento a todo o período em que ficou afastado, desde a sua exoneração até o seu retorno ao serviço público. Nessa linha de entendimento o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim se manifestou (sem os grifos):
EMENTA[1]: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO EFETIVO. ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL C/C REMUNERAÇÃO DO CARGO. EXONERAÇÃO. NECESSIDADE DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOBSERVÂNCIA. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA.
A Administração Pública tem o poder-dever de rever seus próprios atos quando praticados com ilegalidade, pois deles não se originam direitos (Súmula 473/STF). Todavia, é necessário que ela observe, através de procedimento administrativo próprio, os princípios constitucionais do devido Processo Legal e da Ampla Defesa, sob pena de nulidade.
Não existe óbice para que o aposentado pelo regime geral da previdência social passe a ocupar cargo público, pois não se trata de acumulação incompatível com o sistema vigente, nos termos do art. 37, da Carta Magna de 1988.
EMENTA[2]: ADMINISTRATIVO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – MANDADO DE SEGURANÇA – LIMINAR – CONCESSÃO – SERVIDORES EFETIVOS – APOSENTADORIA CONCEDIDA PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL – EXONERAÇÃO – DEVIDO PROCESSO LEGAL – INEXISTÊNCIA – NECESSIDADE – REINTEGRAÇÃO – POSSIBILIDADE – RECURSO NÃO PROVIDO.
– O exercício dos poderes inerentes à Administração Pública sofre limites e restrições previstas na Carta Maior, devendo ser respeitadas, quando suprimidos direitos, as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
EMENTA[3]: DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITO ADMINISTRATIVO – REEXAME NECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – PODER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – EXONERAÇÃO DE SERVIDOR – AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA CONFIRMADA.
– Embora a administração pública tenha o poder de autotutela, consistente na revisão de seus próprios atos, anulando os ilegais e revogando os inoportunos ou inconvenientes, não lhe é dado exercê-lo de modo absoluto, ante as limitações decorrentes do devido processo legal.
– A exoneração de servidor público investido no cargo após aprovação em concurso público não prescinde do prévio e devido procedimento administrativo, de tal sorte que, não instaurado o aludido procedimento, torna-se legítima a pretensão de reintegração ao cargo.
EMENTA[4]: DIREITO ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO ESTATUTÁRIO – APOSENTADORIA PELO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS) – UTILIZAÇÃO DE TEMPO DE EXERCÍCIO PÚBLICO – PERMANÊNCIA NO CARGO PÚBLICO – EXONERAÇÃO DE SERVIDORA – AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO – NECESSIDADE DE ASSEGURAR A AMPLA DEFESA – ILEGALIDADE DO ATO – CONTINUIDADE NO SERVIÇO PÚBLICO – POSSIBILIDADE – ACUMULAÇÃO LÍCITA – PRECEDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
1- É necessário processo administrativo, com ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso, sob pena de nulidade do ato, nos termos da súmula nº 20 do Supremo Tribunal Federal.
2 – O servidor que trabalhou na iniciativa privada por período anterior ao ingresso no serviço público, pode aposentar-se no regime geral a previdência, utilizando-se da contagem recíproca e continuar no cargo público.
3 – É lícita a cumulação de aposentadoria pelo regime geral da previdência e o exercício de cargo público, uma vez que ausente a vedação constitucional para tanto.
4 – Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
EMENTA[5]: APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – SENTENÇA CONCESSIVA DA ORDEM – REEXAME NECESSÁRIO – EXPRESSA PREVISÃO LEGAL – EXONERAÇÃO DE SERVIDOR – PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PRÉVIO – GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO – IMPRESCINDIBILIDADE – ILEGALIDADE DO ATO – DIREITO LÍQUIDO E CERTO VIOLADO – SEGURANÇA CONCEDIDA – SENTENÇA MANTIDA.
Mantém-se a sentença que concede a segurança para reintegrar aos quadros do Município servidor aprovado em concurso, exonerado sem que lhe fossem asseguradas as garantias da ampla defesa e do contraditório.
Sentença confirmada no reexame necessário, conhecido de ofício, prejudicado o recurso voluntário.
EMENTA[6]: MANDADO DE SEGURANÇA – EXONERAÇÃO DE SERVIDORA PÚBLICA EFETIVA – AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO – SÚMULA Nº 20 DO STF – DIREITO À REINTEGRAÇÃO. – Os princípios do contraditório e da ampla defesa são direitos constitucionais garantidos a todos os cidadãos, previstos no artigo 5° da Constituição da República. Nestes termos, não há que se falar em demissão de servidor sem prévio procedimento administrativo disciplinar, vez que devem ser observados os preceitos constitucionais norteadores do devido processo legal.
No mesmo sentido já se pronunciou o Ministro Ricardo Lewandowski do Supremo Tribunal Federal, (sem os grifos): (…) ainda que permitida a exoneração do servidor em razão da impossibilidade de cumulação, esta Corte, no julgamento do RE 594.296/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, entendeu que revogação de ato administrativo cuja formalização tenha repercutido no campo de interesses individuais não prescinde da instauração de procedimento administrativo sob o rito do devido processo legal e com obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa[7].
Nesse caso não se discute se o servidor tem ou não o direito de permanecer no serviço, mas sim a nulidade do ato de exoneração praticado pelo Prefeito Municipal, pela falta do processo administrativo.
- Desnecessidade de desligamento do serviço público em caso de aposentadoria por tempo de contribuição, quando o destinatário for o INSS.
A discussão aqui é outra. Demonstrar-se-á neste tópico que o servidor aposentado pelo INSS por tempo de contribuição poderá, caso queira, permanecer trabalhando no serviço público municipal.
O argumento adotado pelos Prefeitos Municipais para emissão do ato de exoneração do servidor público é aquele de que a Lei Orgânica Municipal ou a lei municipal, esta útima que trata do estatuto do servidor público, preveem que “a vacância do cargo decorrerá de aposentadoria”. Todavia esta regra municipal, analisada de forma literal, é inconstitucional.
É que a “vacância” se verificará de imediato, na hipótese de aposentadoria quando: (a) houver pedido expresso nesse sentido por parte do servidor municipal; (b) se der por motivo de invalidez ou, então: (c) a forma for de natureza compulsória (=idade). E a aposentadoria por tempo de contribuição não se enquadra em nenhuma dessas hipóteses, o que autoriza o servidor municipal a continuar trabalhando. De outra banda, estamos tratando daquela aposentadoria que se dá perante o órgão previdenciário (INSS), responsável pelos pagamentos dos proventos do servidor aposentado.
Todo esse entrave pode ser resolvido pela correta interpretação do regramento previsto no § 10, do artigo 37 da Constituição da República, que veda expressamente a possibilidade de cumulação de proventos de aposentadoria provenientes de regime jurídico próprio (= criado pelo município) com a remuneração de cargo, emprego ou função pública. Confira-se:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
- 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
Os artigos referidos no parágrafo retrocitado – 40, 42 e 142 da Constituição Federal -, prescrevem o seguinte:
Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.
Art. 42. Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Estes artigos versam sobre os regimes próprios de previdência, existentes no nosso ordenamento jurídico previdenciário que, como se sabe, diferem-se do regime geral de previdência, este último mantido pelo INSS – Instituto Nacional do Seguro Social.
Em se tratando de municípios, existem aqueles que possuem regime próprio de previdência com regras próprias e autônomas às gerais, bem como existem aqueles que por não terem efetivado a instituição do regime próprio de previdência, estão submetidos ao regime geral – INSS.
Sendo assim, o servidor público estável que não esteja vinculado a regime de previdência próprio municipal, apenas poderá perder o cargo nas taxativas hipóteses estabelecidas pelo artigo 41, § 1º, I a III da Constituição da República. Confira-se:
Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.
- 1º O servidor público estável só perderá o cargo:
I – em virtude de sentença judicial transitada em julgado;
II – mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;
III – mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.
Hipótese diversa da prescrita em lei configura-se ilegal e abusiva, como é o caso dos servidores que são exonerados ou que são intimidados a se exonerarem do serviço público.
Desta forma, inobstante havendo ou não vedação contida na legislação municipal, no que se refere à impossibilidade do servidor público municipal continuar exercendo as atividades do seu cargo efetivo após sua regular aposentadoria, tem-se que esta proibição não se encontra em consonância com o texto constitucional, estando também muito distante da melhor hermenêutica jurídica.
O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, em resposta a consulta formulada sob o nº 724.503, através do Conselheiro Hamilton Coelho, assim se posicionou:
(…)
Esta Corte também se posicionou sobre a matéria na Consulta n. 719.327 (Sessão de 20/08/2008, Conselheira relatora Adriene Andrade), havendo consignado que a proibição insculpida no art. 37, § 10, da CR/88, não alcança os rendimentos de aposentadoria decorrentes do Regime Geral de Previdência Social, mesmo nas hipóteses em que tais rendimentos são complementados por entidades fechadas de previdência privada ligadas ao Poder Público, como, por exemplo, os Fundos de Pensão para os empregados públicos de empresas públicas e de sociedades de economia mista.
Segue transcrito excerto do voto da conselheira relatora:
Quanto à segunda indagação, acerca da possibilidade de cumulação da remuneração do cargo ao qual o candidato tenha sido eventualmente aprovado, com os proventos da anterior aposentadoria, decorrente, in casu, de Fundos de Pensão de Funcionários de empresas públicas e de economia mista, regidos pelo Regime Geral de Previdência Social, coaduno com o entendimento esposado pela douta Auditoria, a fls. 08, uma vez que a limitação constitucional imposta pela redação do § 10, do art. 37, não alcança os beneficiários de proventos de aposentadoria decorrentes do Regime Geral de Previdência Social e tampouco do Regime de Aposentadoria Complementar. Por oportuno, trago a lume as assertivas do nobre Auditor: ‘Nesse quadrante, o recebimento cumulado de remuneração de cargo, emprego ou função pública com aposentadoria complementar paga por fundo de pensão não se enquadra na vedação contida no transcrito § 10º do art. 37 da Carta Federal. Essa limitação constitucional também não alcança o acúmulo de proventos de aposentadoria pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) com a remuneração de cargo, emprego e função pública.
(…) – sem grifos.
E conclui o i. Conselheiro da Corte de Contas:
- c) na hipótese de o servidor público aposentar-se pelo Regime Geral de Previdência, em decorrência do exercício de atividade remunerada na iniciativa privada, será possível a percepção acumulada dos proventos dessa aposentadoria com a remuneração do cargo, emprego ou função pública, independentemente do seu ingresso na Administração Pública ter ocorrido antes ou após a aposentadoria.
Concluo que servidor em atividade, vinculado ao Regime Próprio de Previdência Social, que se aposentar pelo INSS, em razão de outra atividade que tenha exercido, poderá acumular os proventos da aposentadoria concedida pelo Regime Geral de Previdência Social com os vencimentos de cargo, emprego ou função pública que exerça no município.
Colhe-se do voto do i. Conselheiro farta jurisprudência alusiva a matéria, inclusive do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, que em julgamento do Recurso Extraordinário nº 387.269, com relatoria do Ministro Marco Aurélio de Mello, assim se posicionou:
(…)
O município confere à norma apontada como infringida, ou seja, ao § 10 do artigo 37 da Constituição Federal, alcance que o dispositivo não tem. Como consta em bom vernáculo no texto constitucional, ‘é vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração’. Vale dizer que, consoante bem decidiu o Tribunal de origem, a glosa diz respeito à acumulação de proventos decorrentes da aposentadoria como servidor público, considerando o regime específico e remuneração do novo cargo. A recorrida aposentou-se pelo regime geral de previdência social, não havendo, assim, a impossibilidade de assumir o novo cargo. Pouco importa que haja sido servidora do Município. À luz do texto constitucional, cumpre perquirir a fonte dos proventos, que, iniludivelmente, não está nos cofres públicos. (…) – grifo nosso.
Há referência, inclusive, às decisões do e. Tribunal de Justiça de Minas Gerais (Apelações Cíveis n.ºs 1.0024.03.183806-3/004 e 1.0000.00.301478-4/000):
(…)
Mostra-se lícita a percepção simultânea de remuneração oriunda de aposentadoria no emprego público de Auxiliar de Escrita, paga pelo INSS, complementada pela Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, com aquela decorrente do exercício do cargo de Professor PA5. Deve-se perquirir a razão de existência de determinada norma [art. 37, § 10, da CR/88], fazendo-se interpretação teleológica da regra, para que se entenda o porquê de sua inserção no ordenamento jurídico. A impossibilidade de cumulação de mais de um cargo na atividade e de proventos de inatividade e remuneração pelo exercício de outro cargo ou função, foi criada para que o acesso aos cargos públicos fosse o mais amplo possível, para que determinada pessoa, que já se encontrasse dentro do serviço público, não se beneficiasse de sua situação pessoal para preencher outro cargo e para que suas atribuições fossem exercidas em sua plenitude, da melhor forma possível, além da vedação a que o erário fosse duplamente onerado com o pagamento, à mesma pessoa, de proventos de inatividade e remuneração pelo exercício de cargo público.
O art. 37, § 10, da CF, quando veda a percepção de proventos e vencimentos, explicita que aqueles devem decorrer das regras constantes dos seus arts. 40, 42 e 142, excluindo, com isso, os benefícios oriundos do Regime Geral de Previdência Social, caso da impetrante. (grifo nosso)
(…)
(…)
MANDADO DE SEGURANÇA — CONCURSO PÚBLICO MUNICIPAL — EDITAL — CANDIDATO APOSENTADO PELO INSS E APROVADO — INDEFERIMENTO DE NOMEAÇÃO E POSSE — AFRONTA ÀS NORMAS CONSTITUCIONAIS. […] As condições de participação de brasileiros em concursos públicos somente podem ser fixadas por lei, nunca por regulamento ou edital. O edital de concurso público, apesar de fazer lei entre as partes, não pode conter regras contrárias à lei. Se veda a inscrição de candidato aposentado pelo INSS, cria obstáculos em afronta a norma constitucional que não a prevê (art. 37, I e XVI, e seu § 10 da CF).
(…)
Essa matéria realmente já passou pelo crivo do Supremo Tribunal Federal, o qual já abarcou toda a questão da forma aqui exposta. Confiram-se (sem os grifos):
(…) A pretensão recursal merece acolhida. Esse entendimento está em confronto com a jurisprudência desta Corte firmada no sentido de que a vedação de acumular proventos de aposentadoria com remuneração não se estende ao servir que aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social, acumula proventos de aposentadoria, custeados pelo INSS, com vencimentos do cargo, emprego ou função pagas pelo Estado-empregador[8].
Registre-se que o Tribunal Superior do Trabalho encontra-se posicionado no mesmo sentido. Confiram-se:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA – DESCABIMENTO. 1. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EFEITOS. ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA E VENCIMENTOS. 1.1 O entendimento no sentido de que a aposentadoria definitiva, espontaneamente requerida pelo empregado, não põe termo ao pacto laboral está pacificado na primeira parte da OJ 361 da SBDI-1/TST, incidindo o óbice do art. 896, § 4º, da CLT. 1.2. Diante da diversidade entre as fontes de custeio, não há vedação, em sede constitucional, à acumulação dos proventos pagos pelo Regime Geral da Previdência Social com a remuneração decorrente do contrato de trabalho que permanece em vigor. O art. 37, XVI e XVII, da Constituição Federal alcança apenas os detentores de regime próprio de previdência social – servidores civis (art. 40), militares (art. 42) e membros das Forças Armadas (art. 142), na disposição específica do § 10 do mesmo art. 37 da Lei Maior. Ressalva de ponto de vista do Relator. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.
Processo: AIRR – 1925-44.2011.5.15.0053 Data de Julgamento: 12/02/2014, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/02/2014.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA – PROVENTOS DE APOSENTADORIA E SALÁRIO – IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO – REINTEGRAÇÃO INDEVIDA. Dá-se provimento a agravo de instrumento quando configurada no recurso de revista a hipótese da alínea -a- do art. 896 da CLT. Agravo provido.
RECURSO DE REVISTA. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA – PROVENTOS DE APOSENTADORIA E SALÁRIO – IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO – REINTEGRAÇÃO. Se o empregado continua trabalhando após a jubilação, nova e peculiar relação contratual emerge no mundo jurídico, mas certamente às margens do requisito exigido pelo inciso XVI do artigo 37 da Constituição Federal. Válido, portanto, o contrato de trabalho subsequente à aposentadoria, de modo que se afigura juridicamente aceitável a percepção cumulativa de salários e proventos decorrentes da jubilação, conforme já se posicionou o STF por intermédio da ADIN nº 1.770-4. Ademais, a questão tem um ponto essencial a ser destacado, que é o referente à peculiaridade do contrato de trabalho do reclamante, que, apesar de fazer parte de órgão da Administração Pública Indireta, seu pacto laboral é regido por normas celetistas e sua aposentadoria é regulada pelo Regime Geral da Previdência Social. Não se está, aqui, diante de um servidor público em sentido estrito, o que afasta, por derradeiro, a incidência do artigo 37, §10, da Constituição Federal. Outrossim, a vedação constitucional prevista no artigo 37, § 10, dirige-se apenas à hipótese em que o servidor percebe proventos decorrentes dos regimes previdenciários dos servidores públicos (previstos nos artigos 40, 42 e 142 da Constituição da República), e não à hipótese em que a aposentadoria decorre do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Assim, não há que se falar em acumulação ilegal de vencimentos e proventos. Desse modo, a aposentadoria espontânea da reclamante não desrespeita os preceitos constitucionais relativos à cumulação de proventos e, por conseguinte, não é causa de rescisão compulsória do contrato de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido.
Processo: RR – 133740-73.2008.5.02.0008 Data de Julgamento: 11/02/2014, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/02/2014.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA – EFEITOS NO CONTRATO DE TRABALHO (OJ 361/SBDI-1/TST). RESPEITO À DECISÃO DO STF NA ADI 1770-4 E ADI 1721-3, INCLUSIVE QUANTO À MATÉRIA ACUMULATÓRIA (ART. 37, XVI E XVII E § 10, CF). Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, ante a constatação de má aplicação, em tese, dos parágrafos 1° e 2°, do art. 453 da CLT. Agravo de instrumento provido.
RECURSO DE REVISTA. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA – EFEITOS NO CONTRATO DE TRABALHO (OJ 361/SBDI-1/TST). RESPEITO À DECISÃO DO STF NA ADI 1770-4 E ADI 1721-3, INCLUSIVE QUANTO À MATÉRIA ACUMULATÓRIA (ART. 37, XVI E XVII E § 10, CF). A partir da interpretação dos parágrafos 1º e 2º do art. 453 da CLT, adotada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIN’s 1721-3 e 1770-4, já não subsiste o entendimento de que a aposentadoria espontânea é causa de extinção do contrato de trabalho, o que ensejou o cancelamento da OJ 177/SBDI-1/TST. Isso porque a decisão proferida em Ação Direta de Inconstitucionalidade possui efeito erga omnes, vinculando todo o Poder Judiciário. Logo, se o empregado se aposentar voluntariamente, a continuidade da prestação laborativa após o jubilamento pressupõe unidade da relação empregatícia. Ademais, comprovado que a extinção do contrato não resultou da iniciativa do empregado, nem deu ele ensejo à rescisão unilateral por parte do empregador, o contrato de trabalho é uno, já que a aposentadoria espontânea não o extingue automaticamente. Nesse sentido a OJ 361 da SDI-1/TST. E, em face da unicidade contratual, inexiste a formação de um novo contrato de trabalho a ensejar a prévia admissão por concurso público. Sendo o STF guardião da Constituição (art. 102, caput, CF), cabe ao Judiciário acolher suas interpretações constitucionais e respectivas repercussões. Desse modo, ao decretar, interpretativamente, que a aposentadoria não extingue o contrato de emprego, mesmo na área estatal, abriu flexibilização na regra constitucional vedatória de acumulações, pelo menos se o servidor aposentar-se pelo regime geral (INSS). A decisão do STF, ao manter o servidor no emprego, automaticamente permitiu esse tipo de acumulação – até que nova interpretação surja, se for o caso. Naturalmente que a decisão da Corte Máxima diz respeito à aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição, porém não atinge a aposentadoria compulsória, que extingue inexoravelmente o vínculo jurídico aos 70 anos do servidor. Recurso de revista conhecido e provido.
Processo: RR – 79600-28.2009.5.02.0017 Data de Julgamento: 18/12/2013, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/01/2014. (grifamos).
Na mesma linha de raciocínio, temos os seguintes julgamentos, desta feita do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Confirmam-se (sem os grifos):
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO[9]. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE ERECHIN. APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. EXONERAÇÃO DO CARGO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. Ao menos no juízo de cognição sumária, a aposentadoria do servidor público pelo regime geral de previdência não implica extinção do seu vínculo funcional com a Administração Pública, inexistindo óbice à permanência da autora no exercício do cargo. Precedentes do Grupo. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.
EMENTA[10]: SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE GUAÍBA. APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA PELO INSS. ROMPIMENTO DO VÍNCULO FUNCIONAL NÃO OPERADO. REINTEGRAÇÃO DO SERVIDOR. POSSIBILIDADE. A aposentadoria do servidor pública pelo RGPS não implica extinção do seu vínculo funcional com a Administração Pública, inexistindo óbice à permanência do autor no exercício do cargo. Na espécie, as relações funcional e previdenciária não se confundem. Precedente do Supremo Tribunal Federal. – Não se configura a cumulação indevida de cargos, pois não se trata de nova investidura após a aposentadoria, senão de continuidade do mesmo vínculo funcional. – As hipóteses de perda do cargo público pelo servidor estável são restritas e pressupõem, via de regra, sentença judicial transitada em julgado, processo administrativo ou avaliação periódica de desempenho. A exoneração do autor, servidor estável, contraria as garantias constitucionais do devido processo legal administrativo. APELAÇÃO IMPROVIDA.
EMENTA[11]: REEXAME NECESSÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE SÃO VALENTIM. APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. EXONERAÇÃO AUTOMÁTICA DO CARGO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Segundo já decidido pelo c. Segundo Grupo Cível nos Embargos Infringentes nº 70051219863, a aposentadoria voluntária pelo regime do INSS não provoca a automática vacância do cargo ocupado pelo servidor público, em razão de que não se trata de inativação concedida pelo Município, e que, pois, não lhe pagará qualquer aposentadoria ou pensão. 2. Se o servidor, aposentado voluntariamente pelo INSS, não faz jus a qualquer benefício previdenciário pelo Município, sequer complementação de proventos, inexiste qualquer causa legal ou jurídica para o desligamento efetuado, que não foi antecedido de mínima oportunidade de contraditório e ampla defesa, e ainda significou evidente decesso remuneratório. CONFIRMADA A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO.
Veja-se que a questão encontra-se sedimentada e pacificada nas mais altas Cortes do País, revelando-se flagrantemente inconstitucional toda e qualquer previsão contida em legislação municipal em sentido contrário.
Assim, em razão da fonte pagadora do benefício previdenciário ser diversa da fonte pagadora do vencimento mensal derivado do cargo público até então ocupado pelo servidor público municipal, tem ele o direito constitucional e legal de não ser exonerado do cargo público em razão da aposentadoria e, via de consequência, o direito de permanecer no serviço público até se atingir a idade limite de 70 (setenta) anos, salvo se incorrer nas situações previstas no § 1º do artigo 41 da Constituição da República, ou, por iniciativa própria, solicitar o seu desligamento.
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